A 1ª peça de teatro publicada por
Nelson Rodrigues. E na esteira dessa leitura tenho lido todas as
demais peças desse que foi chamado de tarado, anjo pornográfico e até de “o
Marquês de Sade dos Trópicos”!
Esta peça em 3 atos já anuncia
tudo aquilo que ainda será tratado em profundidade por Nelson Rodrigues:
incesto, traição, hipocrisia, loucura, patologia e psicopatias mil! Todos esses
temas e muitos outros afloram dos textos de Nelson. Se eu gostei desta peça?
Amei! Vi nela todas as nossas doenças encobertas pelo véu de nossas
hipocrisias.
O que aprendo com o Nelson?
Teologicamente, a constatação teatral de nossa natureza totalmente depravada.
Politicamente? Artisticamente? Que nada é neutro, nem à esquerda e nem à
direita! Somos todos pecadores.
Assim como ocorreu no último
livro cristão conservador que li, Pensamentos secretos..., que mostra que há
uma direita religiosa que carece de ser evangelizada, agora em Nelson
Rodrigues, vejo que há uma direita que pode se apresentar fora do pacote
direitista! Por mais contraditório que pareça, mas a direita brasileira sofre
da mesma mentalidade de pacote imposta pela esquerda: ou você compra o ideário
completo do menu ou você será tratado
como “esquerda infiltrada”!
Nelson Rodrigues é um desses que
não se deixa limitar pelas “definições definidas”, rótulos cerceadores,
conceitos impostos. Artisticamente, ousou explorar a sexualidade pervertida em
suas peças, mas, para a surpresa de muitos, fora de seus textos era um
conservador, anticomunista e defensor das tradições e costumes da família
brasileira. Há uma explicação? Há! Todavia, tratarei de esmiuçar Nelson
Rodrigues noutro texto.
Agora limito-me a dizer que tanto
Nelson Rodrigues como Gilberto Freyre foram conservadores, anticomunistas,
todavia execrados e deixados de lado intelectualmente tanto pela esquerda como
pela direita (ou pela burguesia, como gostava de dizer o próprio Nelson). E
mesmo como conservadores e admiradores um do outro, Nelson Rodrigues e Gilberto
Freyre tinham visões de mundo diferentes sobre a formação do homem brasileiro e
nossa antropologia nacional. E aqui é um dos pontos que me chama a atenção em
Nelson. Enquanto que para Gilberto Freyre, o Brasil era uma democracia racial,
Nelson Rodrigues via no Brasil um país totalmente racista, onde até o negro não
gosta do negro (leia a assustadora peça “O anjo negro”)!
O Brasil tem sido dominado,
recentemente, por um “avivamento conservador”. Muitos têm se colocado como de
direita e apresentado suas ideias em oposição às postulações da hegemônica
esquerda brasileira. O que venho observando, contudo, é que dentro desse
movimento “conservador” quem não fecha o pacote não pode ser considerado parte
desse grupo. Assim, um seleto grupo de “católicos monarquistas” têm se
apresentado como os únicos verdadeiros representantes de uma legítima direita
conservadora. Outros restringem o pensamento conservador aos usos e bons
costumes de uma elite, de uma aristocracia, de um modelo de família e
comportamento como critérios para se determinar quem é isso ou quem é aquilo.
É em meio a essa cultura do
arroto que vejo hoje no Brasil, de um arroto conservador, que encontro no
passado recente dois personagens, Nelson Rodrigues e Gilberto Freyre, que
teriam sido lançados no ostracismo por essa nossa direita de facebook, se hoje
estivessem produzindo as obras produzidas naquele tempo. Enfim, temos muito o
que aprender, porque, nas palavras de um sábio indígena amigo meu, “posso ser o
que você é sem deixar de ser quem eu sou” – eis uma preciosa lição a uma
direita que só aceita o que for espelho. Viva Nelson Rodrigues!
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