Fiodor Dostoievski
1.040 Páginas
Editora 34
"A trama é centrada na relação entre o devasso Fiódor Karamázov e seus filhos: Aliócha, "puro" e místico; Ivan, intelectual e atormentado; e Dmitri, orgulhoso e apaixonado.
Com mão de mestre, Dostoiévski conduz o leitor a uma jornada singular
pelos recantos mais sombrios e luminosos da alma humana. A trama
hipnotizante consegue prender a atenção ao longo das 1040 páginas desta
edição da obra, divida aqui em dois volumes."
2 comentários:
Dostoievski, como um profeta moderno, previu o perigo do "cristão-socialista ou do socialista-cristão", e parece que Gramsci leu-o:
"Citarei apenas o que de mais notável me confessou aquele homem: «Todos esses socialistas, anarquistas, ímpios e revolucionários», disse-me, «não nos dão muito que temer. Vigiamo-los e estamos ao corrente daquilo que tramam. Mas há certos homens que acreditam em Deus e são, ao mesmo tempo, cristãos e socialistas. Essa, essa é a gente mais terrível. São de respeito. É preciso ter mais cuidado com o socialista cristão do que com o socialista ateu.» Estas palavras intrigaram-me nessa altura e acodem-me agora espontaneamente à memória, meus senhores".
Fazer uma resenha, de um dos grandes romances de Dostoieviski, é sempre uma missão difícil, pela própria grandiosidade das obras, a complexidade e diversidade temática, muitos personagens e uma trama meticulosamente elaborada. Não é leitura para dispersos e viajantes... Há livros que escrutinam o universo dostoieviskiano, o que sempre me parece uma opção melhor. Como não me vejo capaz de fazê-lo, colocarei alguns pontos percebidos no livro e, certamente, muito do lido não será apresentado.
Todos sabem que não faço um resumo das obras para não tirar a graça e o prazer do leitor ainda não aventurado nas páginas; as vezes, ponho excertos de trechos e comentários rápidos. No caso do Dosty, isso é possível, mas nem sempre aconselhável.
Em linhas gerais, temos vários dos elementos presentes em outras publicações do russo, como em Crime e Castigo e o Idiota, particularmente. Ele esmiúça as relações humanas, de maneira a conhecermos, quase como amigos íntimos, os personagens principais. Neste aspecto, ele se parece muito com Tolstói, na elaboração e detalhamento dos protagonistas e, as vezes, até mesmo dos secundários.
Li, em algum lugar, que há uma crítica ferrenha à Igreja Católica Ortodoxa, o que considero um exagero. Dosty era católico; sendo possível vislumbrar em seus escritos a ligação íntima entre ele e o Cristianismo, pontuado por uma crítica aqui ou ali, eventualmente, mas nada do tipo: "demonizar a igreja ou a religião". Mesmo tendo um personagem ateu (um tipo quase militante), Ivan, um dos Karamazov, ele vê boa parte da sua crença lançada por terra quando confrontado por uma realidade sobrenatural, por sua alma afligida, e que não tem amparo, nem o refrescor, mas apenas o flagelamento, a agonia, da própria descrença caucada na imoralidade (ainda que a descrença seja uma crença, mas uma crença firmada na incapacidade humana).
Além da fé e religiosidade, há uma preocupação com a situação da Rússia, do povo russo, o qual encontra-se em processo de transição política e social, com a difusão dos ideais marxistas e a simpatia dos "intelectuais" pela luta socialista. A uma severa crítica, sim, ao socialista cristão, e ao marxismo por tabela, já que o socialista ganha ares de respeitabilidade pelo Cristianismo assumido, como prova o trecho pinçado e copiado, no comentário acima.
A degradação moral, a ruptura entre os valores cristãos e a degeneração do comportamento defendida pela modernidade, a licenciosidade, o libertinismo, são as causas de muitos conflitos, culminando em morte, acusações, condenações, injustiça. A atitude de Dimitri diante da sua impetuosidade carnal, como algo impossível de se controlar, é o vício gerenciando o caráter do homem, dominando-o, algo talvez hereditário, já que o seu pai, se dispunha a quase tudo a fim de satisfazê-lo também. Na disputa pela consumação dos prazeres, ambos saíram perdendo.
Há muitas provas de afeição, fraternidade e amor (sempre pontilhado pela inveja, ira, megalomania, etc), como no núcleo dos amigos de Alexei, o jovem seminarista, ingênuo e sempre disposto a dar-se pelo outro, uma evidencia clara, e um ponto distintivo do Cristianismo em relação ao mundo e outras religiões.
A trama tem um pano de fundo, a universalidade dos valores ocidentais que os grandes escritores e obras são capazes de descrever, em meio ao caráter volátil e, algumas vezes, obstinado, do homem em seu estado de depravação, mas também refletindo, a grandiosa imagem de Deus.
Só não dei 5 estrelas porque as reservo para a releitura de "O Idiota", antecipadamente condecorado. Pode ser que eu mude de ideia, e inverta as atribuições, ou iguale-as. Mas, por hora, "Os Irmãos Karamazov" parece-me um pouquinho, um tiquinho mesmo, inferior ao "Idiota".
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