Sócrates entrará com a Teoria das Ideias para explicar a existência da multiplicidade das coisas. As Ideias existem por si, portanto são “um”, mas estão separadas das coisas sensíveis, que são múltiplas. A ideia defendida por Sócrates é que as coisas são semelhantes e dessemelhantes, porque cada coisa em si pode ser semelhante com uma ideia da Semelhança e, ao mesmo tempo, ser dessemelhante por participar da ideia de Dessemelhança. Veja que Sócrates não está dizendo que algo pode ser Uno e Múltiplo ao mesmo tempo, pois isso seria o que o surpreenderia. O que Sócrates está afirmando, por meio da Teoria das ideias, é que uma coisa pode ser, por exemplo, semelhante por ser semelhante à Ideia de Semelhante, mas pode ser dessemelhante por participar da Ideia de Dessemelhante. Como exemplo Sócrates pensa no corpo humano que tem o “direito” e o “esquerdo”, o “em cima” e “abaixo”, o “atrás” e a “frente”, isto é, compartilha a multiplicidade; todavia, ninguém negará que é UM corpo humano, uma unidade.
Retornamos às discussões de Crátilo, pois Zenão não considerava que um “dedo grande” poderia ser também um “dedo pequeno”. Heráclito considerava o Ser em fluxo e, como vimos na última resenha, baseado nesta ideia, Protágoras, que defendia que o homem é a medida de todas as coisas, compreendia que uma pessoa poderia dizer que uma coisa era quente e outra pessoa poderia dizer sobre essa mesma coisa que ela era fria e ambos estariam dizendo a verdade. Esta é ideia que Zenão não aceita, pois essa multiplicidade de uma mesma coisa que é e não é gera um paradoxo, uma contradição. Pois Zenão compreende que o nome de uma coisa se identifica com essa coisa. Por exemplo, “dedo grande”, a coisa e sua propriedade (grande) andam juntas, não é possível que “dedo grande” possa se referir a um dedo pequeno. É contraditório. Cada nome refere-se a um objeto. Mudou a característica do objeto, mudou o seu nome, é um outro objeto, portanto não há multiplicidade para Zenão. E Sócrates, portanto, irá apresentar a Teoria das Ideias para explicar essa nomeação aparentemente contraditória de um mesmo objeto.
O problema em Crátilo é a predicação do objeto. Não se pode predicar um mesmo objeto diferentemente. Não se pode aceitar que, como Protágoras e Hermógenes defendiam no convencionalismo, um objeto possa ser predicado “quente” por uma pessoa e predicado “frio” por outra, porque, demonstra Sócrates em Crátilo, fosse assim não haveria conhecimento possível da verdade. Mesmo no naturalismo de Górgias e de Crátilo, ainda que um nome ora espelhasse uma coisa de uma maneira e ora espelhasse o fluxo dessa mesma coisa em seu movimento, também não seria possível conhecer as coisas. Tanto o convencionalismo como o naturalismo foram, portanto, refutados por Sócrates em Crátilo.
Agora, em Parmênides, continuamos buscando uma explicação para o problema da linguagem, o problema do conhecimento, a aquisição possível da verdade. No fim de Crátilo, a conclusão socrática é que, então, devemos buscar conhecer as coisas por elas mesmas e não pelos nomes. Entretanto, como seria aceitável predicações contraditórias diante uma mesma coisa? Esta será a discussão em Parmênides.
Para Sócrates, o paradoxo de Zenão é aparente, pois eu posso me referir a mim como “um” ser humano e, ao mesmo tempo, referir-me ao meu lado direito e ao meu lado esquerdo, ao embaixo e ao em cima, atrás e à frente, etc. Assim, para Sócrates, não há estranhamento em predicações diferentes de uma mesma coisa. É como se estivéssemos observando propriedades diferentes (lado direito e esquerdo) de uma mesma coisa. Entretanto, isto que acabei de escrever é diferente de afirmar que o “Um” é Múltiplo e que o “Múltiplo” é Um. E em Parmênides, Sócrates afirmará que é isso o que causaria espanto: separar as propriedades das coisas e afirmar que elas se misturam. Para Sócrates não há essa mistura, pois a coisa se refere às Ideias, ora a uma Ideia de Semelhança, ora a uma Ideia de Dessemelhança.
Parmênides fará exatamente uma refutação ao modo de entendimento e apresentação da Teoria das Ideias e demonstrará para Sócrates que o Uno e o Múltiplo na verdade, se misturam, se entrelaçam – surpresa (esta palavra no grego é thaumastós, que é a palavra que dá origem ao espírito da filosofia)!
Para acessar a resenha completa da obra, clique aqui. O blog "Bibliotheca de Semiótica" pretende ser um banco de resenhas para interessados e missionários que trabalham com outras culturas. Assim, é característica da "Bibliotheca" que, durante os resumos dos livros, eu faça comentários sobre as ideias do autor, concordando ou refutando, para que o leitor possa encontrar uma crítica e auxílio para a formação do seu próprio pensamento. Boa leitura!
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