Timeu - Platão

Mas, afinal, o que é a imagem? A imagem é a solução platônica que garante a inteligibilidade do mundo. Se retornarmos em nossas leituras e atravessarmos de Crátilo, passando por Parmênides e O Sofista e, finalmente, aportando em O Timeu, poderemos acompanhar a solução proposta por Platão advinda a partir da própria autocrítica de sua Teoria das Ideias.

         Ao lermos estas obras, podemos ver não apenas as aporias das teorias de sua época, mas, principalmente, as aporias levantadas na própria Teoria das Ideias de Platão. A mais importante das aporias está em como os dois mundos – o das Ideias (ou formas) e o sensível – são capazes de se relacionar. Sem uma resposta convincente, como haveria conhecimento do mundo? Como seria possível a inteligibilidade do mundo?

         Vimos em Crátilo que as duas concepções daquela época – o convencionalismo e o naturalismo – em última instância, na verdade, tornam o mundo impossível de ser apreendido pela razão. Ao ponto de, se insistirmos nestas duas teorias, o melhor mesmo é nos debruçarmos sobre o mundo para conhecê-lo em si mesmo e não por meio das palavras. O problema, então, é que a linguagem está revelando as aporias das teorias daquele tempo.

         Em Parmênides, vemos que o que está gerando as aporias não só do convencionalismo e do naturalismo, mas da própria Teoria das Ideias é o dogma de Parmênides de que “o melhor é não seguir pelo caminho do não-Ser”. Para Parmênides, o não-Ser não é, logo, tudo que não é não pode existir, não pode sequer ser julgado como falso ou impossível. O problema é que a própria linguagem ou uso que fazemos dela mostra que o não-ser está a toda hora presente. Então, Platão vê que o dogma de Parmênides precisa ser quebrado para que possamos avançar na teoria da Linguagem e garantir a possibilidade da própria Teoria das Ideias.

         Uma vez destruído o antigo paradigma, em O Sofista, Platão irá aplicar o que foi discutido em Parmênides, aplicando aqueles resultados sobre a própria teoria das Ideias: o não-ser e o ser se imbricam, logo o ser é e o não-ser é. Mas como se dá isso? Para explicar essa relação, Platão irá usar a própria linguagem como modelo para o problema que a linguagem mesmo está colocando sobre a mesa: há nomes que aceitam certas combinações de letras e há outras combinações que não são aceitas, assim se dá também com o ser e o não ser, com o estático e o movimento, com o outro e o mesmo, com uno e o múltiplo. Assim o filósofo está garantido não apenas que o não-ser é, mas também uma nova definição do não-ser. Agora não mais como contrário ao ser, mas como outra coisa, como coisa diferente. Ora, se é assim, então há a possibilidade do erro, da mentira e da falsidade no discurso, porque o discurso pode não corresponder a uma imagem, mas a outra. Então, com isso, Platão também garante a existência das imagens.

         Mas o que é, afinal, uma imagem? É a cópia (mundo sensível) do original (Ideia). E quem é que fará a ligação entre o mundo das cópias e o mundo das Ideias: a linguagem. A linguagem, o discurso (nome mais verbo), é quem se estabelece como um elo, porque a linguagem está nos pensamentos, na razão, no intelecto, que é o lugar que dá acesso ao mundo das Ideias e, portanto, a linguagem é uma cópia do mundo das Ideias, isto é, a linguagem é uma medida, uma proporção (não é uma cópia em todo sentido e extensão e nem mais uma “participação” como fora dito por Platão em diálogos anteriores, mas é uma cópia da essência da Ideia) e, por isso mesmo, pode estabelecer uma comparação do mundo sensível com a Ideia, juntando os dois, garantindo assim a inteligibilidade, o conhecimento humano. Assim, a linguagem, na minha interpretação, é um símbolo, um símbolo do mundo das Ideias.

         E aqui, depois de tudo o que foi dito e, finalmente, chegando à conclusão da linguagem como símbolo, é preciso parar para revisitarmos o assombro inevitável diante de obras escritas às margens da plenitude dos Tempos. Reconhecer que todo o instrumental que será usado para se pensar e discutir a Santíssima Trindade e também a própria Pessoa de Jesus fora dado aqui entre os gregos, fonte para os primeiros Pais da Igreja, para Santo Agostinho, para Tomás de Aquino e tantos outros teólogos cristãos.

         “Jesus é o logos”! Nunca houve e nem haverá afirmação mais contundente e assombrosa do que esta: "Jesus é o logos de Deus"!  Se o discurso, se a proposição, conforme aprendemos em Platão, é uma analogia da essência da Ideia, este símbolo – Jesus é o logos – é um símbolo eterno! E nesta altura de nossas discussões, assumirmos a tese joanina de que Jesus é a linguagem, é o discurso, é a cópia, é a imagem visível do Deus invisível e mais: Jesus é o logos, palavra derivada de lego, que significa “re-unir”, “juntar”, “ligar”, “re-unir” na possível proporção duas coisas diferentes, distintas entre si, enfim, é como se Deus estivesse preparando o mundo para, por meio do mistério da encarnação, começar a reunir o cosmos novamente a Ele. Por que não ser mais ousado e afirmar abertamente: Deus, chegada a hora certa, enviou seu Filho amado (Gl 4: 4) e, quando todas as coisas lhe estiverem sujeitas, então também o mesmo Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos (1 Coríntios 15:28).

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